Café Com Crime

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Fim 🧵

Depois disso, a história de Cesarina Martins do Nascimento entra em silêncio. Não há registros sobre seu cumprimento de pena, sua morte, sua fuga ou seu destino final. Ela some da mesma forma que atuou durante anos: entre sombras, manipulações e lacunas impossíveis de preencher.

A responsabilidade recaiu integralmente sobre Cesarina, que, segundo o Ministério Público, receitou o formicida movida por interesse financeiro, explorando a fragilidade de Maria e transformando a fé alheia em negócio lucrativo. Foi condenada a 14 anos de prisão em regime fechado.

Ela novamente alegou ter sido enganada por Cesarina para obter lucros, já que a golpista sabia do dinheiro do seguro de vida de seu marido. O júri acolheu essa versão e absolveu a viúva.

No tribunal, a defesa de Maria de Lourdes sustentou que ela acreditava estar servindo uma poção natural para curar o marido do vício, não veneno.

Por dois anos, o caso ficou sem respostas, até que, em 1961, o jornal Diário da Noite revelou que ambos haviam sido capturados e levados a julgamento, ao lado de Maria de Lourdes, pela morte de João da Cunha.

Mesmo assim, no dia 16 de janeiro de 1959, a Justiça concedeu habeas corpus a Cesarina, entendendo que ela não atrapalharia a investigação. Em liberdade, ela e Ezequiel desapareceram.

As acusações eram graves, mas nenhuma pôde ser provada. Outros supostos mortos também apareceram vivos, como Joseph Hinds, um americano e ex-amante de Cesarina que teria sido envenenado e jogado no rio Pinheiros, mas surgiu na delegacia dizendo que só havia mudado de cidade.

Ezequiel contou que encontrou uma lista com cinco nomes que seriam futuras vítimas de Cesarina, incluindo o dele. Disse também que ela já havia matado amantes anteriores e, possivelmente, dois dos próprios filhos, Joãozinho e Maria Helena, décadas antes.

Já Maria afirmava ter sido enganada por Cesarina, acreditando que os pós e preparos que recebeu da feiticeira serviriam para curar o alcoolismo do marido. Ela alegou que jamais concordou em cometer um assassinato. Com a prisão da feiticeira, outras histórias começaram a emergir.

Na delegacia Cesarina também afirmou que nunca acreditou em nada espiritual e que comandava na verdade um “sindicato do crime”, que envolvia enganar seus fiéis. Ela até mesmo performou um ritual falso na frente dos agentes para mostrar como fazia seu trabalho.

Cesarina não demorou a confessar sua participação no envenenamento, afirmando que Maria de Lourdes havia concordado com o plano e que ela mesma organizou tudo.

Em seguida, a polícia foi até a casa de Maria de Lourdes, justamente no dia em que ela aguardava o pagamento do seguro de vida de João. O dinheiro foi bloqueado e ela também foi levada à delegacia para prestar depoimento.

Investigadores prenderam Cesarina, o marido Ezequiel e o próprio Odilon. Foram apreendidos livros da tenda, anotações e a confirmação de que a golpista cobrava preços altos pelos seus “trabalhos”.

Contou ainda que o caso de suicídio do ferroviário foi na verdade um crime encomendado. Maria de Lourdes havia contratado a morte do marido e o veneno usado vinha da tenda da Estrada de Cotia. A denúncia desencadeou uma operação imediata.

Após ser ameaçado de morte por Cesarina, que prometeu envenenar a água do poço da família dele, Odilon revelou o esquema completo: a falsa mãe de santo manipulava clientes, extorquia seus fiéis, vendia supostos trabalhos espirituais e aceitava encomendas de assassinato.

E teria sido, se não fosse pela desavença de Cesarina com Odilon Joaquim Pimentel, um de seus cúmplices. Em 7 de janeiro de 1959, oito meses depois da morte de João, Odilon apareceu na Delegacia de Homicídios decidido a denunciar tudo.

A menina encontrou o pai caído sob a árvore e correu de volta em desespero. Quando a polícia chegou, nada parecia além do óbvio: um homem alcoólatra, sozinho em casa, morto. Era o final perfeito para um crime que jamais seria descoberto.

Na manhã de 14 de maio, Maria serviu ao marido uma xícara de chá misturada ao veneno e saiu de casa com os cinco filhos. Enquanto conversava com vizinhas na rua, pediu que a filha de oito anos voltasse para casa e avisasse João que o almoço estava a caminho.

Pelo serviço, cobraria 60 mil cruzeiros, parte desse valor retirada do seguro de vida de João. Em troca, entregou a Maria uma lata de formicida e garantiu que ninguém desconfiaria.

Primeiro, Cesarina entregou a Maria um pó de vidro moído para misturar ao café do marido. Depois, orientou que fervesse pedaços de couro de cobra para liberar uma suposta toxina mortal. Quando nada funcionou, ofereceu um plano definitivo.

Maria de Lourdes passou a frequentar a tenda acreditando que Cesarina pudesse ajudar João a abandonar o vício e, assim, arrumar o seu casamento. O que recebeu em troca foram instruções e “preparos” que, segundo a feiticeira, acabariam de vez com os problemas do lar.

No livro de atas da tenda, Cesarina registrava contribuições, consultas e pequenos “trabalhos”, mas também serviços muito mais lucrativos, como amarrações, separações e até encomendas de morte.

A golpista atendia suas clientes ao lado do marido, Ezequiel, e do comparsa Odilon, e transformava a fragilidade emocional delas em lucro certo.

Lá, na Estrada de Cotia, funcionava a Tenda São Judas Tadeu, comandada por Cesarina Martins do Nascimento, uma mulher que fingia incorporar entidades, realizar trabalhos e curar vícios.

Mas a morte de João não começou naquele quintal. Ela foi planejada, em Cotia, quando Maria de Lourdes, exausta da rotina de violência doméstica constante e do álcool, buscou ajuda em um lugar que acreditava ser espiritual, mas que era o epicentro de golpes e manipulação.

João tinha histórico de alcoolismo e, mesmo depois da polícia ter encontrado cianeto de potássio na cozinha da família, foi concluído que ele havia tirado a própria vida. O caso foi encerrado e sua esposa, Maria de Lourdes, tornou-se viúva aos 32 anos, com cinco filhos pequenos.

Em 14 de maio de 1958, João Rosa da Cunha, ferroviário aposentado de 40 anos, foi encontrado morto sob uma árvore no quintal de sua casa, na Vila Santa Maria, em São Paulo. A cena parecia simples demais para levantar suspeitas.